Foi apresentado o parecer do relator do PL 7.804/2014 na Comissão de Finanças e Tributação (CFT) da Câmara dos Deputados.
Além de manter o mesmo texto problemático aprovado na CTASP, o relatório apresenta diversos equívocos.
O Projeto de Lei nº 7.804, de 2014, salvo melhor juízo, não implica aumento de despesas públicas, haja vista que a disponibilização de dados públicos na internet, a princípio, poderia ser absorvida como parte da atividade rotineira da administração pública.
Até aí tudo bem, embora tenha faltado argumentar que, em diversos entes públicos, esta já é uma atividade que está absorvida há anos como atividade rotineira da administração pública, o que não seria alterado.
O mesmo não se pode dizer, todavia, em relação aos quatro projetos apensados, já que todos eles preveem a instituição de “Laboratórios de Inovação” pelos entes públicos. Presume-se que tal inovação implicaria o aumento de despesa pública, havendo a necessidade, portanto, de se estimar o respectivo ônus financeiro para o setor público.
Aí começam os problemas. O relator parece desconhecer o fato de que neste ano foi aprovada a Lei nº 14.129, ou Lei de Governo Digital, que já instituiu em seu Capítulo IV os laboratórios de inovação. Isso se repete, ainda, em um trecho mais adiante:
ressaltando-se que em ambos os casos é afastada a criação de Laboratórios de Inovação, que tenderiam a onerar o setor púbico (sic).
Assim, o mérito de cada um dos projetos de leis apensos ao PL 7.804/2014 deveria sim ser analisado:
- nas mudanças que propõe fazer aos laboratórios de inovação; e
- quanto à técnica legislativa, promover as alterações que pretende na supracitada lei existente, em vez de criar uma nova lei.
Uma rápida olhada no teor dos PLs 68/2019, 624/2019 e 4796/2019 me leva a crer que, se os textos não for iguais, são muito semelhantes entre si, com algumas diferenças em relação à Lei 14.129, que já está em vigor:
- estabelecem os laboratórios de inovação como obrigatórios (“Os entes públicos deverão instituir Laboratórios de Inovação”), enquanto que a lei que está em vigor os coloca como opcionais (“Art. 44. Os entes públicos poderão instituir laboratórios de inovação”)
- colocam a seguinte redação, a qual inclusive estava presente no art. 46 do PL aprovado pelas casas legislativas e veio a se tornar a Lei 14.129, mas que foi vetado pelo presidente da república:
As ideias, ferramentas, softwares, resultados e métodos inovadores desenvolvidos por meio de licenças livres não restritivas.
No mínimo, entendo que a volta desse artigo deveria ser incluída no PL 7.804, visando ao máximo reaproveitamento pela sociedade daquilo que for produzido com recursos públicos, e considerando que não implicaria em aumento de despesa (que é o foco da análise da CFT).
O equívoco maior, no entanto, vem no tema principal do PL, que são os dados abertos.
observa-se que a Subemenda Substitutiva da CTASP é ainda mais conservadora no que tange à oneração administrativa do setor público, visto que exclui até mesmo a obrigação de sítio eletrônico específico na internet para a disponibilização de dados abertos. Conforme salientado no Voto do Relator da matéria na CTASP:
Neste ponto, acreditamos que a instituição de um novo portal eletrônico não é muito produtiva; pode-se perfeitamente utilizar-se dos portais eletrônicos de transparência, já existentes, que poderiam ter uma seção dedicada a dados brutos e abertos. De todo o modo, tal problema deve ser resolvido quando da regulamentação da lei.
Este fato, que me havia passado despercebido quando da análise do Substitutivo da CTASP, na postagem acima, é de suma importância. Hoje, é um problema conhecido que alguns dados abertos importantes são difíceis de se encontrar, pois ficam misturados em meio aos labirínticos portais institucionais. Há até mesmo casos emblemáticos, como o do quadro societário de empresas e CNPJ, da Receita Federal, que se recusa a catalogar no portal dados.gov.br, deixando-o apenas em meio às suas milhares de páginas institucionais.
A obrigação de se ter um portal de dados abertos, opcionalmente sendo um portal único de transparência e dados abertos, viria em muito contribuir para facilitar que o cidadão encontrasse esses dados com maior facilidade. Tratar a questão na regulamentação da lei, como ora proposto, é ignorar o problema nos níveis federados subnacionais, onde é muito provável que o poder executivo não tenha conhecimento, experiência ou vontade política para resolver este problema específico – mesmo que faça uma regulamentação própria da lei, é quase certo que a questão seria ignorada, como já é hoje.
No mais, o PL segue com os mesmos problemas já conhecidos do Substitutivo da CTASP. Sendo o mais grave deles a possibilidade de privatização dos dados públicos, produzidos com recursos públicos, no decorrer de execução de políticas públicas, mas que nunca poderão ser abertos uma vez que passarão a ser propriedade privada das empresas contratadas. Na pior das hipóteses, privando até mesmo a própria administração pública de a eles ter acesso.